30/04/2007

como se ouvisse uma canção pop alegre cantada com feições tristes, o tatu tomou a sua resolução de tomar resoluções de maneira mais eficaz. tomou essa resolução no momento imediatamente anterior ao qual percebeu que sua carapaça o incomodava um pouco o caminhar. preferiu direcionar a atenção à sensação tátil que a areia causava em suas patas. o grande receio do tatu era deixar de discernir um gavião de um pardal. ainda que um e outro dessem a menor bola para o tatu. ele caminhava e no meio da caminhada pensou na necessidade de caminhar, para tomar água na bica. concluiu dever continuar, pois a água era imprescindível para o bom funcionamento de suas células e tecidos e órgãos e tudo o mais. parou um instante diante do sopé do morro que existia há milênios ao lado da bica e calculou o transtorno que lhe seria subir aquilo tudo, com suas patas curtas. diante disso, observou ser mais conveniente cavar um quartinho e dormir ali mesmo. pensou nessa observação e em tantas outras que lhe vinham difusas à mente, como procurar outra bica; pedir a alguém que lhe buscasse a água; escrever um tratado sobre a falácia da necessidade da água para o regular funcionamento do organismo; contornar o morro, ainda que se andasse dez vezes mais, provavelmente sem sucesso, pois a água de seu organismo acabaria nesse ínterim; parar e esperar chover. foi então que ideou dar cinco passinhos adiante. novo cálculo comprovou ter ficado o monte menor. cinco passinhos e novo cálculo. mais cinco, percebeu que o cálculo lhe tomava tempo e energia. mais cinco e mais cinco. eu não vejo mais o tatu, mas suponho esteja na beira da bica, bebendo água, enquanto o pardal procura grãos e o gavião algum animalzinho com uma carapaça menos dura.