Jongueira
Me ensinaste às seis e quinze de um sábado
O amor do abraço que vi
Do riso puro
Da saia comprida que mostra
rodando
Não mais que tuas coxas
Pés no chão
Livre
Cabelos paulistas
Deliberadamente ondulados, salve!
Conheces as pessoas
Todos te abraçaram
Eu te segui com os olhos
E ri
Pelo teu riso
Dancei
Pela tua ginga
Jonguei e jongo e jongo e jongo
Foi difícil jongueira
Certificar teu estado de adulta
(Ela tem altura, mas e daí
Tem seios, mas e daí?
Tem bunda, mas e daí?
Tem tatoo em cima da bunda
Mas e-da-í??
Ela fuma, caipora
É ela fuma e tem umas imperceptíveis rugas
OK, ela é adulta).
E daí?
Que diferença isso faz pra ti jongueira
Se por mais que mudes, jamais perderás essa inerente liberdade?
Nunca mais te verei
Sei nem de que universo paralelo e mágico ou município vieste
Sei nem em qual neurônio meu responsável por lembrar de ti
Passarás, jongueira de hoje às seis e quinze,
- Não a de a partir de amanhã -
A residir
Que diferença isso faz pra ti jongueira,
Que dançarás o jongo pela eternidade
Distribuindo perfume e alegria a nós pobres,
Amém?
***
Seo ditiiinho O senhor não vai se lembrar de mim0 seo ditinho faz três anos
Como vai
Bem e o senhor
Falei com o Saulo semana passada estive lá
Ah ele comentou comigo
Olha o senhor tá ocupado vim só trazer essas duas fotos aqui não é pra copiar
Sei é pra me inspirar
Isso só pra ter uma idéia de como vai ficar
Trouxe também isso que escrevi estava pensando ontem (1)
Ah mas que danado
E essa aqui foi quando fui lá pela primeira vez faz três anos é sua
Obrigado vou até por uma frase embaixo como se ele estivesse pensando
Do jeito que o senhor fizer está bom Vou deixar o senhor conversar com as pessoas tem muita gente chamando Quando voltar lá a gente conversa com calma
Faz isso mesmo lá a gente conversa até mais inspirado
Isso vou tomar café com o senhor
Essa aqui é minha segunda esposa mãe do Saulo e do Samuel
Tudo bom com a senhora
Tudo de bom pra vcs, sucesso e parabéns
***
(1) Ao Grande Ditinho.
Licença meu bom senhor,
Fineza deixe-me achegar
Pois um pedido importante
Fez-me vir dum lugar distante
Enfrentando chuva e calor
A suas valiosas mãos confiar.
A muitos um simples papel
Com algumas figuras em cores
Que trouxe guardado no couro
Mal sabem os ilustres senhores
Retratam meu grande tesouro
Que Deus quis levar ao céu.
Com satisfação e esperança
Cruzei a paisagem paulista
Com sorriso de criança
Em busca desse grande artista
Quem sabe ver não se engana
A alegria que de minh’alma sai:
Homenageio meu saudoso pai
Pelas mãos de Ditinho Joana
***
Aí foi isso. A idéia era levar ao Ditinho Joana umas fotos uma poesia e outra foto, numa pastinha de couro debaixo do braço e passear um pouco. Mas aconteceu uma explosão. 180 municípios representados e representantes da cultura popular paulista. Não vou descrever o que vi. Por duas horas e meia meus sentidos foram excitados pelas minhas raízes. Profusão de pessoas felizes por estarem ali. Entardecer puramente dionisíaco, não fosse o aspecto religioso sempre presente na cultura paulista. Orgulho. Alegria. Nostalgia. Esperança. Paz. Eu me envolvi numa placenta ancestral e, de repente, nas pessoas, nas cores, nas comidas, nos aromas, na dança, nas obras, na história, no olhar castanho escuro e risonho da jongueira, nos tambores, na viola e na vibração, eu reconheci o espelho virgem em epígrafe.