21/09/2006

Relatos de um ser fóbico

Este triste relato foi elaborado por Paula Indalecio, minha sócia e amiga, de quem pedi licença para compartilhá-lo com todos vocês, nesta sessão de catarse coletiva.
Esta nova amiga irá se apresentar no auditório de nossa sessão e dirá assim:
"-Meu nome é Paula Indalecio. Hoje eu não bebi, mas voei de avião"

Lá vai. Peguem seus lencinhos.


“Samba do avião” é coisa de Tom Jobim... esse momento bossa nova... esse momento “minha alma canta”.
Não é novidade o fato de que minha alma não costuma cantar quando dentro do avião. Mas ontem ela quase saiu do avião e subiu aos céus.
Enfim, essa história que lhes vou contar é a prova de que, comigo, o negócio mesmo não é samba. Nem bossa nova. É Rock and Roll. Ou melhor, é Heavy Metal.
Ontem fui fazer uma audiência em Cuiabá. Para começar, já está tudo errado. Por que raios um avião pra Cuiabá tem que fazer escala em São José do Rio Preto? Por que é que um cidadão de São José do Rio Preto precisa ter um vôo direto pra Cuiabá e vice-versa?
Bom, aí deu tudo certo da audiência e consegui pegar o vôo mais cedo pra São Paulo. Não um vôo direto, mas um vôo para São José do Rio Preto, onde deve ter uma colônia de férias para Cuiabanos.
Já começou errado. Na sala de espera tinha uma moça muito simpática, mas dessas que mandaríamos para o “Presídio de pessoas cafonas”. Ela carregava uma recém-nascida no colo, com travesseiros, sacolas, bolsas, fraldas e casacos, e, na mão que sobrava, ela segurava a outra filha de 5 anos.
Ah, tudo isso sobre um salto agulha de 10 centímetros que fazia parte de uma sandália preta com tiras de cetim que amarravam nas gordas canelas. Muito adequado para quem vai subir as escadas do avião com duas crianças e 350 sacolas.
Obviamente, tal pessoa sentou-se ao meu lado. E, obviamente, tive de segurar a pequena para que ela pudesse colocar o cinto em si mesma, e na filha de 5 anos, que se sentava no corredor.
Aí vem o aviso: Senhoras e Senhores, solicitamos a todos que desliguem o seu telefone celular a partir desse momento. Eis que a fulana do meu lado diz: “aí... ta lá em cima na sacola. Não pega nada se eu não desligar, né?” Aí eu do jeito que sou, disse: “pega sim. Dá interferência. Pede pra aeromoça”.
A aeromoça chega, com balas, ela e a filha avançam, mas não falam nada do celular. Não hesitei: “por favor, pegue a sacola branca dela, que o celular está lá?” Peguei a sacola e segui as instruções da dona para encontrar o aparelho e desligar. Até aí, tudo lindo.
O vôo transcorreu normalmente, até peguei no sono. Recusei o lanche da tarde, mas a filha da mulher comeu 2. Sozinha.
Quando o avião começa a descer para o pouso em São José do Rio Preto (afinal, os Cuiabanos deveriam estar ansiosos para chegar na colônia de férias numa quarta-feira), o piloto liga os avisos de atar cintos. Aí a mulher me pergunta: “será que minha filha pode ir ao banheiro sozinha?” Ao que respondi, com toda minha experiência aérea: “Não. Estamos descendo, não é seguro. Ela tem que ficar aqui”. A mãe contra-argumenta: “Mas ela está quase vomitando... comeu dois lanches...”. Ao que respondi, imediatamente: “então manda ela correr. Logo.”
A aeromoça interceptou meu plano. Fez com que a menina voltasse ao posto, deu um saquinho pra ela e disse: “se quiser vomitar tem que ser aqui mesmo”. E eu pensei: “Brrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrreeeeeeeeegada, sua desgraçada”.
O avião vinha descendo para o pouso tão esperado. Queria aquela fedelha gulosa longe de mim. Mas quando faltava muito pouco, o piloto fez o favor de arremeter! Com a subida abrupta, a menina não agüentou e vomitou. Fora do saquinho obviamente.
Imaginem a cena. Eu, morrendo de medo do avião que arremeteu por um motivo desconhecido, segurando a recém-nascida para que a mãe pudesse acudir a gulosa. Obviamente a recém nascida começou a babar na minha roupa, porque a fraldinha dela foi utilizada para outros fins.
O piloto fez a volta, disse que as condições do tempo não eram boas e pousou pelo outro lado. E a neném pousou comigo, óbvio. Babando, obvio.
Lindo. Chegamos, a mulher foi embora, deram uma limpada do assento e vamos seguir viagem.
Pensa que acabou? Não comprem ainda.

Fim do primeiro ato.

Segundo ato.

Estou lá no mesmo bat-posto, agora sentada ao lado de um rapaz muito simpático que tinha razões concretas para sair de São José do Rio Preto e ir pra São Paulo. Ia pegar um vôo internacional em Guarulhos.
A decolagem começa a atrasar e eu acho ótimo, porque a pista é pequena, está chovendo, e vejo relâmpagos por todos os lados. O piloto vem dar um recado, para “acalmar” os apressados: Senhoras e senhores, aqui é o comandante. Estamos atrasados primeiro porque chove muito aqui, depois porque estamos acima do nosso peso de decolagem, e a pista está molhada. Então, estou aguardando que me enviem de São Paulo os novos cálculos de velocidades de pista, porque eu só tenho os de pista seca”.
Ai eu já pensei: “O! o! o! meu amigo. Sharing, not scaring, please! Too much information”. Eu juro que eu preferia ficar na ignorância. Fiquei pensando e rezando pela mente do encarregado do cálculo: não erre, por favor, não erre!
Eu tava com medo, mas como o mesmo vôo já tinha sofrido uma arremetida, pensei: dois raios não caem duas vezes no mesmo lugar.
Aparentemente ele não errou o cálculo. O avião subiu. Mas como tudo na minha vida tem a ver com música.. “o avião vai subindo, vai caindo a garoa, o céu é tão horroroso, e a noite não é boa”. Nessa hora só lembrei do São João e de todos os outros santos.
De fato o avião subia, mas não parava de chover.

Finalmente o clímax:

“XTACCHHHHHHHHHHHHHHHHHH CABUMMMMMMMMM”
CAIU A MERDA DE UM FILHO DA PUTA DE UM RAIO NA TURBINAAAA (sorry, mas não dá pra dizer diferente).
Do meu lado, acreditam???????? Eu vi as faíscas... comecei a tremer

Achei que eu fosse morrer... confessei meus pecados, pedi perdão a Deus, mas o avião chegou. E nada se falou sobre o assunto."

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